A literatura infantil tem papel
fundamental na aprendizagem das crianças, pois ela revela à criança a realidade,
dando-lhe a oportunidade de decodificar o mundo por meio de suas emoções e
sentimentos. Conforme
Ataide (1995, p. 9), a literatura infantil “leva a descoberta dos aspectos do
mundo que rodeia o leitor, age sobre as forças do intelecto (imaginação, senso
estético, descoberta do que vale e do não vale na vida, descoberta da beleza da
palavra e dos valores humanos).”
A criança por meio da leitura
desenvolve seu senso crítico, dialogando e questionando aquilo que não a agrada
na visão do autor, bem como, desenvolve a fantasia e seu imaginário, criando
seu mundo a partir de suas próprias impressões. Segundo Ataide (1995, p. 10),
A criança quer fantasia, sonho,
imaginação: a transformação profunda do real – é um modo pelo qual ela aprende
a ver o mundo. O realismo infantil é pouco diferente, talvez, do realismo
adulto. A invenção da fantasia é justamente aquela que apanha os dados do real
e os manipula de tal sorte que se aproxima do mítico, do fantástico, do
surrealista.
Voltemos ao conceito
de fantasia para a psicanálise de acordo com La Planche (1982,
p. 169):
Roteiro imaginário em que o
sujeito está presente, e que representa, de modo mais ou menos deformado pelos
processos defensivos, a realização de um desejo e, em última análise, de um
desejo inconsciente. A fantasia apresenta-se sob diversas modalidades: fantasias
conscientes ou sonhos diurnos; fantasias inconscientes como as que a
psicanálise revela como estruturas subjacentes a um conteúdo manifesto;
fantasias originárias.
É por meio da beleza da palavra da
literatura que as crianças enfrentam seus medos e angústias. As literaturas
infantis, principalmente os contos de fadas, expõem medos, carências, morte,
velhice dentre outras dificuldades e geralmente garantem no final que tudo dará
certo com a expressão “e foram felizes para sempre”, e isso fornece a criança a
força necessária para enfrentar os seus problemas. Além do mais falam de amor,
autodescobertas, sonhos, as dificuldades de ‘ser criança’ e as de ‘crescer’.
Não existe assunto proibido para tratar com as crianças, pois as palavras
suavizam as dificuldades e contribui para a superação. Para Bettelheim (1980),
Todos os problemas e
ansiedades infantis, como a necessidade do amor, do medo e do desamparo, da
rejeição e da morte, são colocados nos contos em lugares fora do tempo e do
espaço, mas muito reais para crianças. A solução, geralmente encontrada na
história, quase sempre leva a um final feliz, indica a forma de se construir um
relacionamento satisfatório com as pessoas com as quais convive. Segundo esse
autor, a atividade lúdica é para a criança um dos meios principais de
expressão. Possibilita-lhe a investigação e a aprendizagem sobre as pessoas e
as coisas do mundo, ao favorecer-lhe o desenvolvimento dos aspectos cognitivos,
assim como a simbolização do mundo interior de pensamentos e afetos, pois, por
meio da imaginação, a criança pode dar vazão a seus desejos, conflitos e
vivências mais íntimas. (apud CANTARELLI; CARDOSO, SIMIONI, 2006)
Livros como “A história meio ao
contrário” (2005) de Ana Maria Machado descontextualizam os contos de fadas
mostrando a criança que pode ela envelhecer, ter medos, perder, errar, ficar
furiosa, infeliz e mesmo assim ainda pode ser feliz, pois ninguém está feliz para sempre, mas pode ser feliz para sempre. As palavras
tornam-se deleitosas aos ouvidos infantis que fantasiam.
O humor trazido nas literaturas é a
melhor forma de questionar assuntos sérios, pois a criança tem a capacidade de
perceber no humor questões sérias que estão implícitas no texto, mesmo que não
perceba internaliza de forma inconsciente e quando amadurece torna consciente
em atitudes, mas os livros não devem abandonar o cômico da imagem, que tratará
de uma nova leitura pela criança e incitará a imaginação. Porém, o autor de
livros infantis deve ter o cuidado para não infantilizá-lo como se a criança
não entendesse o que está escrito,
O pensamento da criança não é análogo
ao pensamento mítico ou ao dos selvagens, como querem fazer entender alguns
estudiosos. Ela sabe decodificar o real, tem suas próprias preferências (que é
preciso respeitar) e consegue sentir, embora não faça um discurso lógico (quase
sempre fraudulento). A sua intuição faz com que perceba a realidade circundante,
suas pressões, desafios e contradições. A criança não é imbecil. O leitor
infantil aborrece livros que buscam imbecilizá-lo, mentindo, dizendo que é tudo
maravilhoso, cor-de-rosa; ou que tudo é feio, péssimo. (ATAIDE, 1995, p. 11)
Outro cuidado importante que Ataíde
(1995, p. 25) ressalta é com a escolha das palavras utilizadas. As rimas tornam
o texto mais atraente para o leitor e lhes da satisfação ao lê ou escutá-las.
O som é o sentido. Nos jogos verbais,
quando o material lingüístico é tratado como brinquedo, temos que a linguagem é
uma forma de libertação da criança, pois ela não pensa naquilo que está
dizendo, porém se extasia com a auto-expressão. A atividade lúdica da linguagem
permite ao indivíduo descobrir a importância do meio, do instrumento da comunicação.
As palavras ganham outros contornos, pois não dizem coisas, elas são coisas.
Um passo muito importante para que a
literatura infantil exerça um papel fundamental no
desenvolvimento da criança, vem ser o incentivo de pais e professores em torná-la
um leitor assíduo, levando-a a explorar os textos literários, pois a leitura desencadeara
uma postura reflexiva perante o mundo em que a mesma vive.
Bettelheim (1980, apud
GONZAGA, 2011) afirma que, a partir do contato com um texto literário de
qualidade, a criança é capaz de refletir, indagar, questionar, escutar outras
opiniões, articular e reformular seu pensamento, pois a criança desenvolve por
meio da literatura, o potencial crítico e reflexivo.
Portanto, a literatura
infantil é uma ferramenta fundamental na constituição do leitor, mas quem a
utiliza no processo de ensino-aprendizagem deve ter o cuidado de não usá-la de
forma maçante, com um único intuito de alfabetizar, pois desta forma poderá provocar
sérios danos à formação do individuo e a sua capacidade de interpretação
literária, ou não. É importante ter as
literaturas voltadas para as crianças como um instrumento que propicia o
desenvolvimento cognitivo de forma prazerosa, desperta a curiosidade e a
imaginação.